Leia abaixo a íntegra da carta de Palocci à presidente do PT
Publicado originalmente no site do G1, em 26/09/2017
Em carta, Palocci pede desfiliação do PT: 'Somos um partido ou uma seita guiada por uma pretensa divindade?'
Político foi preso pela Operação Lava Jato e respondia a
processo administrativo da legenda, por falas feitas contra o ex-presidente
Lula.
Por Marcelo Rocha e Samuel Nunes, RPC Curitiba
Palocci envia carta ao PT com duras críticas e pedido de
desfiliação
O ex-ministro Antônio Palocci enviou nesta terça-feira (26),
uma carta ao Partido dos Trabalhadores (PT), em que pede a desfiliação da
legenda. No documento de quatro páginas, ele descreve os motivos pelos quais
resolveu deixar o partido que ajudou a fundar. A carta é endereçada à
presidente do PT, senadora Gleisi Hoffmann. (Leia no fim do texto a íntegra da
carta)
Na carta, Palocci diz que:
Defende um acordo de leniência na Lava Jato para o PT
As declarações dadas no depoimento a Moro “são fatos
absolutamente verdadeiros”, situações que presenciou, acompanhou ou coordenou,
“normalmente junto ou a pedido do ex-presidente Lula”
Diz ter certeza que Lula irá confirmar tudo, “como chegou a
fazer no ‘mensalão’” em entrevista na França
Houve uma evolução e acúmulo de corrupções nos governos a
partir do segundo mandato de Lula
Foi um choque ter visto “Lula sucumbir ao pior da política
no melhor dos momentos de seu governo” Que foi um erro eleger e reeleger um mau governo, que
destruiu “cada conquista social e cada um dos avanços econômicos tão
custosamente alcançados”
Que Lula encomendou sondas e propinas em uma reunião com
Dilma e José Sérgio Gabrielli no Palácio da Alvorada, “na cena mais chocante
que presenciei do desmonte moral da mais expressiva liderança popular que o
país construiu em toda nossa história"
Que passou a ser alvo de “um tribunal inquisitorial dentro
do próprio PT” ao falar a verdade
Questiona “até quando vamos fingir acreditar na
autoproclamação do ‘homem mais honesto do país’”
Questiona se “somos partido político sob a liderança de
pessoas de carne e osso ou somos uma seita guiada por uma pretensa divindade?”
Que mesmo nos melhores anos do governo Lula “já se via a
peçonha da corrupção se criando para depois tomar conta do cenário todo”
Palocci respondia a um processo aberto pelo diretório
municipal de Ribeirão Preto, em São Paulo, em que era acusado de trair a
fidelidade partidária. Ex-ministro dos governos Lula e Dilma, ele foi alvo de
uma comissão de ética pelas declarações feitas contra o ex-presidente Luiz
Inácio Lula da Silva ao juiz Sérgio Moro, no dia 6 de setembro.
Na ocasião, ele disse que Lula mantinha um “pacto de sangue”
com o empresário Emílio Odebrecht, o que incluía um pacote de R$ 300 milhões em
propinas para o PT, além de agrados ao ex-presidente.
Na carta, Palocci faz uma série de críticas ao PT e ao
ex-presidente Lula. O ex-ministro diz que estranhou o processo aberto contra
ele, não pela condenação que já recebeu na Lava Jato, mas pelas declarações
contra Lula. "Pensava ser normal que o partido procurasse saber as razões
que levaram a tal condenação e minhas eventuais alegações. Mas nada recebi
sobre isso", escreveu o ex-ministro.
Ele reafirma que todo o conteúdo do depoimento criticado
pelo PT trata apenas da verdade dos fatos. O ex-ministro não entra em detalhes
sobre o que sabe a respeito de ilegalidades, porque ainda negocia um acordo de
delação com a Justiça. "De qualquer forma, quero adiantar sobre as
informações prestadas em 06/09/2017 (compra do prédio para o Instituto Lula,
doações da Odebrecht ao PT, ao Instituto Lula, reunião com Dilma e Gabrielli
sobre as sondas e a campanha de 2010, entre outros) são fatos absolutamente
verdadeiros", afirma.
Ele diz acreditar que, em breve, "o próprio Lula irá
confirmar tudo isso, como chegou a fazer com o 'mensalão', quando, numa
importante entrevista concedida na França, esclareceu que as eleições do Brasil
eram todas realizadas sob a égide do caixa dois, e que era assim com todos os
partidos".
Palocci diz que participou ativamente de todas as
realizações do partido. "Sei dos erros e ilegalidades que cometi e assumi
minhas responsabilidades. Mas não posso deixar de destacar o choque de ter
visto Lula sucumbir ao pior da política, nos melhor dos momentos do seu
governo", diz.
"Até quando vamos fingir acreditar na autoproclamação
do 'homem mais honesto do país' enquanto os presentes, os sítios, os
apartamentos e até o prédio do Instituto (!!!) são atribuídos à Dona Marisa?
Afinal, somos um partido político sob a liderança de pessoas de carne e osso ou
somos uma seita guiada por uma pretensa divindade?", questiona.
Críticas ao jeito de governar
Além das críticas a Lula, o ex-ministro também falou sobre
as gestões petistas e atacou o modo com que o PT conduziu as decisões
governamentais.
"Alguém já disse que quando a luta pelo poder se
sobrepõe à luta pelas ideias, a corrupção prevalece. Nada importava, nem mesmo
o erro de eleger e reeleger um mau governo, que redobrou as apostas erradas,
destruindo, uma a uma, cada conquista social e cada um dos avanços econômicos
tão custosamente alcançados, sobrando poucas boas lembranças e desnudando toda
uma rede de sustentação corrupta e alheia aos interesses do cidadão",
disse em referência a Dilma.
Palocci diz que o PT acabou deixando uma herança ruim ao
país. "Nós, que nascemos diferentes, que fizemos diferente, que sonhamos
diferente, acabamos por legar ao país algo tão igual ao pior dos costumes
políticos", afirmou.
Por fim, ele relembra a atuação política desde a fundação do
PT e dos mandatos que recebeu. "Coordenei várias campanhas eleitorais, em
vários níveis e pude acompanhar de perto a evolução de nosso poder e nossa
deterioração moral. Assumo toda as minhas responsabilidades quanto a isso, mas
lamento dizer que, nos acertos e nos erros, nos trabalhos honrados nos piores
atos de ilicitudes nunca estive sozinho", diz.
Leniência partidária
Apesar das críticas, Palocci também fez sugestões ao PT. Ele
diz acreditar que o melhor caminho para o partido é reconhecer os erros e
buscar um acordo com as autoridades. "Há pouco mais de um ano, tive a
oportunidade de expressar essa opinião de uma maneira informal a Lula e Rui
Falcão, então presidente do PT, que naquela oportunidade transmitia uma
proposta apresentada por João Vaccari, para que o PT buscasse um processo de
leniência na Lava Jato", diz.
Ele diz que ainda acredita na proposta do PT, mas defende
que o partido deva se rejuvenescer. "Depurar e rejuvenescer o partido será
tarefa para nossos novos e jovens líderes. Minha geração talvez tenha errado
mais do que acertado. Ela está esgotada. E é nossa obrigação abrir espaço a
novas lideranças, reconhecendo nossas graves falhas e enfrentando a verdade.
Sem isso, não haverá renovação", afirma.
O que Lula disse a respeito?
Quando Lula foi ouvido por Sérgio Moro, no dia 13 deste mês,
ele afirmou que Palocci é mentiroso e inventou a história do “pacto de sangue”
para agradar os responsáveis da Lava Jato com os benefícios de uma possível
delação, ainda em análise. Para a defesa do ex-ministro, Lula é
"dissimulado" e mudou de opinião após Palocci ter decidido
"falar a verdade".
Em nota ao Jornal Nacional nesta terça-feira, o
ex-presidente declarou que Palocci inventa acusações sem provas para obter um
acordo de delação premiada. A defesa do ex-presidente afirmou, ainda, que o
depoimento prestado por Palocci à Justiça, no começo de setembro, é repleto de
contradições com relação ao depoimento que o ex-ministro já tinha prestado em
maio deste ano e que a carta divulgada nesta terça-feira segue na mesma
direção.
O que diz o PT?
Em nota, a presidente do PT, senadora Gleisi Hoffmann,
afirmou que Palocci mente. Para ela, o ex-ministro já está fora do partido
"política e moralmente". "A forma desrespeitosa e caluniosa como
se refere ao ex-presidente Lula demonstra sua fraqueza de caráter e o desespero
de agradar seus inquisidores", afirma. Veja a íntegra da nota.
Texto e imagens reproduzidos do site: g1.globo.com
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